domingo, 9 de setembro de 2012

NÃO QUERO MAIS




Não quero mais
os litorais,
e tantos sais,
a maresia e a salina,
a chuva cheirando a peixe.

Não quero mais
os carnavais,
os ai ai ais,
os fevereiros,
os desordeiros.

Não quero mais
essa gente
que come hóstias e
curte cores e
cheira flores e
são tão imorais.

Quero que me deixem
em paz.
Quero eu e nada mais.
Eu só
já sou demais. Sou
uma multidão, não sou ninguém,
sou alguém entre ninguéns.

Não quero mais
essa gente
que come hóstias e
curte cores e
cheira flores e
são tão imorais.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

CRESCE




É dia de... pela primeira vez... por conta própria comprar minhas cuecas. Mantenho-me em pé, confuso frente à vitrine. Observo os anúncios de peças íntimas, com modelos masculinos que enchem as cuecas, as deixam volumosas. Confundo-me em que tamanho escolher, pensando que o tamanho da cueca era decidido de acordo com o tamanho do órgão que ela iria cobrir. Qual peça, afinal, corresponderia a um órgão tamanho padrão? Talvez um pouco abaixo do padrão. Só um pouco.
Observando-me na vitrine, aquele anti-projeto refletido naquela vitrine, pus-me a raciocinar: então as genitálias não fazem parte da imagem e semelhança de Deus? Então as genitálias são apenas meios de manutenção do corpo físico e térreo que não é divino?
— Posso ajudar, moço?
Perguntou-me uma das atendentes da loja, de largo sorriso e maquiagem exagerada. Quis convidar-lhe para escolher cuecas e lingeries, quis convidar-lhe para provar cuecas, quis convidar-lhe pra uma foda rápida e mal gozada, quis convidar-lhe para o ovo que ainda não digeri. Que nunca vou digerir.
— Posso lhe ajudar?
Constrangido, desviei o olhar para a seção de meias.
— Não, obrigado.
Um homem precisa sentir-se seguro, mesmo que indefeso, perante cuecas, modelos masculinos seminus em anúncios (modelos volumosos). “Não, obrigado” é frase agressiva, que elimina qualquer ímpeto de fraqueza, que desestrutura o ouvinte e fortalece o orador.
A atendente deu uma rabissaca e saiu.
As cuecas, assim como os homens, têm uma linha evolutiva de infantil para adulto. A cueca é a ferramenta criada pra marcar os estágios de desenvolvimento do homem.
Cueca: pedaço de pano que cobre as partes, não valoriza o ego. Algumas, assim como bojos em sutiãs, deveriam vir de fábrica com enchimento frontal, para satisfação de alguns.
Eu precisava me concentrar no ato de comprar cuecas, na minha libertação, no simbolismo da minha independência de adulto, com genitálias versão adulta, peludas e escurecidas.
Para afirmar-me mais em minha convicção masculina, de que agora o Eu maduro não seria afetado em escolhas de cores, fiz a escolha certa. Comprei uma cueca rosa.



Quinta-feira, 17 de setembro de 2009